São Paulo – A prefeitura de São Paulo quer aproveitar o "ímpeto e o destemor" dos skatistas paulistanos para recuperar áreas degradas no centro da cidade. A proposta é simples: identificar locais abandonados na região e adaptá-los à prática do skate, instalando pistas e obstáculos que atraiam jovens dispostos a fazer manobras e se divertir em espaços públicos.
"Pensamos no skate como elemento de reabilitação de praças e lugares de uso comum", revela o subprefeito da Sé, Marcos Barreto. "Os skatistas ganham espaços propícios à prática do esporte e nos ajudam a reabilitar áreas que hoje viraram depósito de entulho. Todos saem ganhando, inclusive os demais moradores da capital: com novos espaços, os jovens deixarão de utilizar áreas inapropriadas para o skate, como a Avenida Paulista."
Barreto confessa que nunca teve "competência" para deslizar sobre uma tábua com rodinhas. Porém, afirma reconhecer a importância do skate como instrumento de coesão social de uma ampla parcela da juventude paulistana. "Cerca de 500 mil pessoas praticam esse esporte na cidade", anota. "Na grande maioria das vezes, andam em grupos: se reúnem para fazer manobras, vencer desafios e mostrar suas habilidades uns aos outros. Isso traz movimento às praças."
O vice-presidente da Confederação Brasileira de Skate (CBSk), Edson Scander, reforça os argumentos da subprefeitura. "É uma excelente ideia", avalia. "Os lugares que já foram adaptados para a prática de skate, e que antes estavam abandonados, acabaram ficando cheios de vida. E outras pessoas – não só skatistas – passaram a frequentá-los."
Quatro áreas
É essa vida que o subprefeito da Sé pretende levar a alguns espaços públicos degradados no centro. Uma comissão formada por membros da administração municipal e representantes da CBSk vistoriou dez áreas na região, das quais quatro foram selecionadas – e três devem passar por reformas até o final do ano, assegura Barreto.
A principal delas é o Parque Dom Pedro II, que a prefeitura pretende transformar num parque para a prática não só de skate, mas também de outros esportes radicais. Scander lembra que a modificação do espaço, hoje ocioso, foi absorvida como proposta de governo pela campanha do prefeito Fernando Haddad por sugestão dos skatistas.
"É uma área plana, fácil de construir, e que atualmente conta com um padrão muito baixo de zeladoria urbana", comenta Barreto. "Você ainda pode ter outras funções coexistindo no mesmo espaço. Queremos construir um muro de escalada, por exemplo, além de equipamentos para os moradores da região: um avô que deseja levar seu neto para brincar, uma pessoa que vai passear com o cachorro, ler um livro ou fazer ginástica. O mais importante é permitir a diversidade de grupos e usos na praça."
A praça de esportes radicais, porém, deve demorar um pouco para sair do papel devido à falta de verbas da Subprefeitura da Sé. "O orçamento desse ano está bastante apertado, então não dá para garantir rapidez", alerta Barreto. "Mas faz parte do nosso planejamento." Uma alternativa à contenção de verbas são as parcerias com instituições públicas e privadas – que já existem para a manutenção de áreas verdes.
Outras três áreas pré-selecionadas, porém, podem ser adaptadas à prática do skate com maior agilidade. Estão localizadas na Baixada do Glicério; na Praça Julio Mesquita, na esquina das avenidas São João e Duque de Caxias; e embaixo do Viaduto do Café, na Bela Vista, onde antes havia um ringue de boxe. "É um lugar bem interessante, porque fica muito próximo à Praça Roosevelt", avalia Barreto, lembrando o local que deu início ao diálogo do poder público com os skatistas.
Déficit
No dia 4 de janeiro, logo na primeira semana do novo governo, alguns jovens que praticavam skate na recém-reformada Praça Roosevelt foram agredidos por homens e mulheres da Guarda Civil Metropolitana (GCM) contrários à sua permanência no local. O operativo foi registrado em vídeo por um adolescente e rodou a internet. A prefeitura reagiu afastando os guardas responsáveis pela pancadaria e instalou um processo de diálogo com os usuários do lugar: skatistas, mas não só.
O subprefeito da Sé participou das conversas. Barreto vê com bons olhos o surgimento de grupos que pregam uma ocupação cada vez maior dos espaços públicos da cidade, seja para cultura, seja para esporte, e acredita que o papel da administração é mediar os interesses às vezes conflitantes que inevitavelmente surgirão quando as pessoas saem de suas casas e resolvem usar as praças da cidade.
"Nosso grande desafio é combinar, entre todas as pessoas, uma regra de convivência. Para isso, é preciso abrir as portas e estabelecer o diálogo", diz. "Numa cidade como São Paulo, com muitas áreas carentes de espaços públicos qualificados, é natural que apareçam conflitos em relação ao uso que os cidadãos querem dar a esses lugares."
Edson Scander, da CBSk, acredita que boa parte dos conflitos provocados pela prática do skate nas ruas e praças da cidade se deve ao imenso déficit de equipamentos públicos propícios para o esporte em São Paulo. Apenas na região central, diz, existem aproximadamente 20 mil skatistas. "E só uma pista pública, muito pequena, que fica ao lado da Câmara dos Vereadores, e que foi feita de maneira equivocada, sem acompanhamento de especialistas", lembra. "Enquanto não houver locais adequados pra prática de skate na região da Sé, esses conflitos não serão resolvidos."
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